Aspiradores de lança-perfume (31 de janeiro de 1956)

Não sabemos bem qual a dosagem etílica disso que se chama lança-perfume e que é complemento indispensável para o tríduo (que é quatríduo) momesmo.

O que é certo é que a substância etílica não é das menores e sua aspiração não se recomenda a ninguém. No entanto, nesses bailes tipo “aperitivos carnavalescos”, já se têm verificado, à miude, o abuso dessa prática. Pessoas de ambos os sexos, adultos e crianças, vivem aí, em salões de baile, na vista de todo o mundo, com lenços ensopados de éter, aspirando tal substância. Também não temos elementos para dizer das consequências da embriaguez por aspiração de líquido de lança-perfume. Cremos, no entanto, tratar-se de uma embriaguez tanto ou mais consequenciosa do que a do próprio álcool.

As autoridades policiais, os dirigentes de clubes, todos, enfim, deveriam trabalhar, no sentido de coibir o uso dêsse expediente. Sábado último, num clube da cidade, observamos um garoto “enchendo o nariz” com o lenço embebido em lança-perfume. O rapazinho parecia experimentar uma sensação extraordinária, ao cheirar o lenço. Parecia mesmo que subia às nuvens, transportando-se para um mundo fantástico, tal a frequência e a insistência que aspirava o narcótico. Não sabemos o resultado, mas temos quase a certeza de que o garoto não terminou bem aquela noite.

O lança-perfume, tempos atrás, era uma brincadeira inocente. Esguichava-se nas vestes o seu líquido. Brincavam mocinhas risonhas e também “barbados”. Hoje, não. Hoje quem compra lança-perfume, ou aspira o seu conteúdo num lenço, ou vai direto aos olhos do próximo. Nem criancinhas escapam. Estando com os olhos arregalados, admiradas naturalmente com o pandemônio que não entendem, as criancinhas são as principais vítimas dos malvados que confundem brincadeiras com indelicadezas e mesmo estupidez.

Há dois anos, numa “terça-feira gorda de carnaval”, presenciamos um fato curioso: Um folião, que apesar de trajar camisa listrada tinha mesmo cara de malandro, esguichou uma saraivada de lança-perfume numa criancinha de tenra idade, que se encontrava nos braços da mãe. Acontece que o pai e esposo estava próximo e o negócio mudou de figura. Quando o bebê gritou, como é natural e o folião riu, “gozando” o ato, um punho forte e impetuoso chocou-se com sua cara, derrubando-o. O homem quase enlouqueceu de ódio. Atirou-se sôbre o esguichador de lança-perfume e socou-o sem dó. Um policial separou os dois e pretendia conduzi-los para o xadrez. Uma pessoa de nossa redação, que se encontrava perto e que assistira a cena, interferiu em favor do agressor. Consequência: o folião aquela noite não “se esbaldou” em nenhuma “gafieira”, porque foi dormir no xadrez.

O lança-perfume deve ser usado para os fins a que se destina. Não para atirar nos olhos do próximo e nem tampouco para aspirar e embriagar-se com êle.

Deve ser proibido, principalmente o uso de sua aspiração em lenços. A polícia e todos os cidadãos, especialmente os responsáveis pelos clubes que oferecem os bailes carnavalescos, deverão impedir o emprego do lança-perfume para tais casos.

Extraído do Correio de Marília de 31 de janeiro de 1956

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