Nós somos assim... (10 de abril de 1957)

Aquêle que milita na imprensa, mormente a imprensa interiorana, que é conhecido de todo o mundo, torna-se obrigatoriamente um tipo curioso, diferente, às vezes esquisito, por vezes exótico, suspeito, condenável, elogiável, ou digno de ódio ou bajulações ao mesmo tempo.

Nem todos compreendem perfeitamente bem, a missão do cronista. Nem todos estão capacitados a entender, de modo categórico, seguro e positivo, o trabalho do jornalista bem intencionado, aquêle que por profissão ou por amor ao ofício, propôs-se a exercer um verdadeiro sacerdócio, na missão de informar, orientar, criticar em termos, difundir e divulgar os fatos.

Todo mundo gosta de receber elogios, de ver ressaltadas suas ações, de perceber em relevo seu nome. Ninguém consegue conformar-se, ao receber uma crítica, nem mesmo sabendo-a razoável, cabível e justificável.

Se o jornalista delineia um acontecimento com destaque de um nome, recebe a gratidão dêsse nome e de seus amigos verdadeiros; ao mesmo tempo, a repulsa dos adversários dessa pessoa, que nem sequer se dão ao trabalho de auscultar o dever e a obrigação do trabalhador da imprensa. Se, ao contrário, critica um nome, embora tenha a seu favor as manifestações de apreço ou aplausos daquêles que são contra êsse mesmo nome, não faltam censuras ao seu ato, quer por parte do atingido, quer por parte do número de correligionários do mesmo.

Numa cidade interiorana, é comum ficarmos nós, os jornalistas, rapidamente conhecidos. É mesmo banal o sermos citados à miude, nos bares, nas ruas e em diversos lugares. Uns nos olham com desconfiança. Outros, com desprezo. Outros, ainda, com indiferença. Há também os que nos temem, porque têm seus “rabos de palha”. Existem os que nos consideram como somos, avaliando bem o nosso dever. Também há os que gostam de lançar aplausos gratuitos à queima roupa.

Ontem tivemos a prova do que estamos escrevendo: Um cidadão, personalidade insuspeita, político respeitável, sem jamais ter feito politicalhas ou politicagens, opinava sôbre nossas referências a outra pessoa de suas cordiais relações; e dizia, sem hipocrisia, que devíamos manter nossa linha de conduto. Enquanto isso, um outro nos tecia elogios públicos num momento e em seguida ia “sentar-nos a lenha” frente a um particular amigo. Por outro lado, uma terceira pessoa nos cercava na rua, convidando-nos insistentemente para um clássico cafezinho de um e cinquenta, endeusando-nos de tal modo confundidor. Principiando por falar sôbre cinema, mudar para política, referindo-se às festividades de 4 de abril, discorrer sôbre o MAC, para, finalmente, pedir-nos, de modo meio temeroso, opinião sôbre o atual prefeito municipal.

Outros sugerem campanhas que só poderiam interessar aos próprios solicitadores. Existem os que desejam que lancemos verdadeiras batalhas, nas quais teríamos que gastar todos os cartuchos, com uma previsão antecipada de derrota, pelas possibilidades negativas que as mesmas apresentam de antemão. Há ainda os que entendem que somos aquilo que se chama de “galo de briga”, acusando pessoas ou grupos, desprezando a razão e as futuras consequências.

Vejam os leitores, como somos e como trabalhamos. Diariamente recebemos telefonemas e cartas, daquêles que não podem ou não querem, ou ainda, não têm coragem de abordar-nos pessoalmente. Se uns nos elogiam, aplaudem, sugerem novas campanhas, novas lutas, opinam sôbre novos temas que devamos patrocinar, outros condenam nossas atitudes, com justificações de pouco crédito ou de pouco fundamento, evasivas, vingativas, cínicas por vezes, de autênticas “dôres de cotôvelos”.

Na rua, algumas pessoas olham-nos como se fôssemos verdadeiros “dinosauros”. Quando ingressamos em recintos públicos, se temos a nosso lado uma onda de simpatia e apreço, de estima mesmo, podemos estar certos de que não faltará, por outro lado, alguma parcela de desconfiança, ira às vezes, inveja e até de ódio.

Estamos habituados com isso tudo, pois são “ossos do ofício”. Assim é o jornalista, inclusive aquêle que é sadio e bem intencionado como o nosso, que só tem o objetivo de servir à causa do bem.

Nós somos assim. E continuaremos assim. O dia em que não fôr possível essa diretriz, “enforcaremos o ofício”.

Extraído do Correio de Marília de 10 de abril de 1957

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