A gripe e os médicos marilienses (18 de outubro de 1957)

Não propriamente por vocação, mas sim por imposição de nosso “velho”, permanecemos, no passado, cerca de cinco anos num laboratório, atrás do balcão de uma farmácia. Sem jamais termos aberto um livro de patologia, para, sôbre suas páginas termos queimado pestana, conseguimos, mercê dessa circunstancia, conhecer pequenas particularidades de doenças comuns e saber das conveniências ou inconveniências de determinadas drogas ou aplicações.

Desde essa época, mantemos ainda conosco, a convicção de que não se conhece até o momento, um medicamento apropriado para acabar com o vulgar vírus da chamada gripe comum, essa que grassa em todos os cantos do mundo, em qualquer época do ano. Temos mesmo a impressão de que todos os medicamentos chamados anti-gripais não possuem os efeitos bi-laterais que deveriam apresentar, isto é, combater o vírus e preparar o organismo para melhor resistência, durante a doença e durante o tratamento. os anti-grupais existentes, no Brasil ou em outro qualquer país, possuem sòmente a segunda condição, pelo que pensamos. Já é alguma coisa, convenhamos.

Daí o não nos admirarmos em não ter sido descoberta até o presente, uma vacina de eficácia comprovada para acabar com êsse mal, especialmente a chamada “asiática”, cujo vírus foi isolado. Tais medicamentos, aliados aos processos pela classe médica de todo o mundo, como higiene, cuidado, repouso e alimentação, tem a rigor a missão precípua de preparar o organismo para uma reação a contento, que é mesmo o único meio de resistir à gripe ou recebê-lá de maneira mais branda.

E, pode-se dizer, sem receio de errar, que na maioria dos casos, os efeitos biológicos de tais preventivos anti-gripais, tem obtido resultados positivos, não propriamente pelas suas propriedades anti-bióticas, mas sim pela conjugação das medidas sanitárias preconizadas e quer nos dias de hoje, quer nos tempos de antanho.

Bem, mas o assunto principal desta crônica não é mesmo a apreciação dessas especificações farmacêuticas e sim o caso da “asiática” entre nós e a distinta classe médica mariliense. Gostamos de ser claros em nossos pontos de vista e temos por lema o falar com a sinceridade de caboclos que somos. Estamos, publicamente, rendendo uma homenagem ao(s) médicos do Serviço Sanitário da cidade, extensiva aos senhores médicos particulares, farmacêuticos dos diversos órgãos sanitários de Marília. O despreendimento demonstrado pela abnegada classe dos discípulos de Hipócrates e seus diretos auxiliares, o espírito de solidariedade humana testemunhados diuturnamente em incontáveis casos e em determinados pontos da “urbe” e mesmo da zona rural, não podem ser desconhecidos pelo público. Não estamos sendo gentís e nem prestando favores ou bajulando ninguém, neste nosso costumeiro artigo diário. Estamos apenas salientando um fato que deve merecer destaque especial.

No momento, as febris atividades das autoridades sanitárias, estão bem mais diminuídas do que dias anteriores, quando a epidemia da “asiática” estava no auge de sua força entre nós. mas não cessou e não cessará, temos a certeza, enquanto a situação a respeito não voltar à perfeita normalidade.

Os médicos e funcionários do Centro de Saúde, do Dispensário de Tuberculose e de outras diversas organizações oficiais, não têm descansado um momento sequer. Os funcionários, desde o mais humilde até o mais categorizado, igualmente têm emprestado uma colaboração digna de encômios, trabalhando durante várias horas por dia, sem qualquer recompensa pecuniária, perfeitamente compenetrados do grande dever público. Médicos particulares têm colaborado com as autoridades sanitárias e com o sr. Prefeito Municipal. Sabemos de esculápios que têm visitado doentes, por iniciativa própria, sem interêsses financeiros, muitoas vezes em que os “piquetes” sanitários oficiais não tenham podido atender de súbito os milhares de chamados recebidos. Sabemos de farmacêuticos que têm desrespeitado o convênio vigente entre as farmácias, para atender doentes fóra de hora e local, uma vez que o assunto era mesmo aquilo que se podia chamar de calamidade pública.

O próprio sr. Secretário de Saúde, professor Carlos Gama, conheceu “de visu” os trabalhos a respeito, desenvolvidos em Marília. E teceu encomiosas referências ao serviço, bem como se congratulou com os marilienses, pelo andamento de tais trabalhos.

Nosso preito de reconhecimento, a êsse exército de abnegados que colocaram, antes e acima de tudo, o bem estar público, numa demonstração inequívoca de solidariedade humana, princípio básico do Cristianismo.

Dissemos, quase no início desta crônica, que estamos falando com sinceridade acerca dos médicos. Tem tal afirmativa sua explicação: em épocas anteriores, nos referimos aqui, casos de alguns médicos, que hoje em dia não exerciam o sacerdócio da medicina e sim se apresentavam como simples comerciantes. Os que assim agiram no passado, souberam condignamente, corrigir aquilo que se nos pareceu errado. O exemplo dêstes dias é meritório da gratidão de todos os marilienses, sem exceção.

Extraído do Correio de Marília de 18 de outubro de 1957

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