Acerca de Escolas... (4 de dezembro de 1957)

Nossa despretensiosa crônica de ontem, trouxe-nos alguns comentários encomiosos. Talvez sem motivo, uma vez que não descobrimos nenhum “ovo de Colombo”, não desvendamos nenhum segrêdo.

Acontece que um leitor nos procurou para felicitar-nos e agradecer-nos o conteúdo do escrito. Declarou que nosso comentário “abriu-lhe os olhos”. E justificou a afirmativa dizendo, que, até aqui, nunca se preocupara com o estado de aproveitamento escolar de seus filhos e só voltava os olhos para o assunto, por ocasião dos exames finais, conhecendo os resultados do ano letivo. Achou que tínhamos razões no ponto de vista emitido, de que a preocupação de hoje, na maioria do mundo estudantil, resume-se naquilo que dissemos chamar-se “passagem de ano”. E citou-nos exemplos conhecidíssimos.

Efetivamente, o fato acontece conforme dissemos. O aproveitamento das aulas recebidas durante o ano letivo, regra geral, vem se apresentando pouco concreto. Algumas “recordações” em cima da hora dos exames e um pouco de sorte é tudo que grande parte dos estudantes de nossos dias almeja, sem maiores preocupações em possuir um diploma e saber honrá-lo condignamente. Prova disso é o grande número de detentores de pergaminhos (inclusive universitários), sem condições dignas de comprovar técnica ou cientificamente a conquista.

Preocupamo-nos com o problema do estudo no Brasil, por um motivo muito sério: porque não pudemos auferir os conhecimentos que pretendíamos. Daí, em relação àquilo que haurimos das luzes da ciência e nossas observações comparativas acerca de casos cotidianos que temos conhecimento, mais nos convencemos dos motivos anteriormente externados. Das falhas e deficiências que apresenta o ensino no Brasil – desde o primeiro (ano) até o (curso) universitário –, êsse pormenor é um fato de suma importância. Outro lado que inegavelmente contribue para o atual estado de coisas, é a deficiência de mestres especializados para ministrar os variados ramos da ciência escolar.

Por isso é que sempre fomos apologistas da causa do ensino em nossa cidade. Por isso que em 1945 escrevemos nossa primeira croniqueta acerca da criação de uma Faculdade em Marília, cujo título, se a memória não nos falha, foi: “Marília, cidade pobre de escolas”.

Verdadeiramente, os atuais métodos de ensino de nosso país, precisam passar por radical transformação. A rigor, revolucionária metamorfose. Urge que os estudantes de hoje se compenetrem melhor da conveniência e urgência de mais acurado aproveitamento das aulas recebidas durante o ano, abandonando o habito de “recordações” em épocas de pré-exames. Precisamos de um melhor selecionamento de mestres especializados, impedindo professores leigos de lecionarem matérias de folêgo, em prejuizo para eles próprios e para o futuro estudantil. Urge também que as escolas consigam preparar psicologicamente a mocidade de hoje, de formas a receber os impactos do futuro, incerto e difícil, abandonando-se aquelas idéias de louros do pretérito, as fases gloriosas do passado pátrio. Estas devem ser detalhadas com respeito, mas dentro da realidade e com as comparações verdadeiras de que certos fatos do acaso jamais poderão servir de exemplos futuros.

A mocidade estudantil deve bem perceber certas contingências existentes entre as casualidades de antanho e as viáveis realidades porvindouras. Deve aquilatar, dentro do sentido de razão, a equidistância e inaplicabilidade de determinados exemplos históricos.

Não que pretendamos, com êste ponto de vista, olvidar páginas de ouro de nossa história ou da vida de nossa gente. Absolutamente. Apenas entendemos que já é tempo de mutar-se o sistema de ensino no Brasil e que é dever dos que educam, colocar a mocidade hodierna, em condições capazes de receber o ricocheteamento da vida futura, sem fantasias ou ilusões exemplificadas no passado, por força das circunstâncias, ganhando agora a reta do obsoletismo.

Autoriza-nos tal assertiva, os exemplos que já passamos: uma série de instruções de determinadas matérias, jamais utilizadas na vida prática; por outro lado, a divergência existente e comprovada, acerca do patriotismo adquirido no calor dos bancos escolares, que, em verdade, foi muito diverso daquele patriotismo exigido na Itália, aos “pracinhas” brasileiros que cumpriram o dever pátrio.

Extraído do Correio de Marília de 4 de dezembro de 1957

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