“A leitora do telefone” (18 de janeiro de 1958)

O autor desta coluna equiparou-se ao João Jorge. Possúe, igualmente, a sua “leitora do telefone”. Todos os dias, em hora quase matemática, conversa conosco. Pelo jeito, pessoa letrada e ilustrada. Idealista. Bem mariliense, sobretudo.

Por vezes, nos critica severamente. Outras ocasiões, nos estimula sobremaneira. De início, quando os primeiros telefonemas coincidiam com momentos de “apêrto” na redação, chegamos a ficar um tanto aborrecidos com a longa conversa. Depois, não; principiamos a perceber que as palestras dessa leitora (que diz não perder um de nossos modestos escritos), começaram a dar-nos a certeza de que o interêsse mariliense alentando pela mesma, é muito mais cimentado do que à primeira vista se nos pareceu.

No telefonema de ontem, a misteriosa personagem abordou o artigo que escrevemos sôbre o título “JK contra os aumentos”. Verberou em têrmos a conduto do atual Presidente da República, considrado pela mesma, como “não correspondendo” ao alto cargo. De acôrdo, senhora (ou senhorita). De pleno acôrdo. Nós mesmo temos dispendido uma série de críticas ao sr. Juscelino Kubitschek. Sucede que, com alusão aos despachos referidos nas exposições de motivos citadas em nossa crônica em tela, a atitude presidencial mereceu um voto de louvor. Pelo menos assim entendemos. Tanto que “torcemos” para que outras medidas idênticas, em diversos outros setores, fossem igualmente tomadas.

Quanto à Brasília: Não somos, em absoluto, contra a sua “fabricação” (porque, pensamos, Brasília, realmente, não está sendo construida e sim “fabricada”). Somos contrários, isto sim, quanto à fórma com que a nova Capital Federal vem sendo executada. Somos visceralmente aversos ao processo déssa instalação, na época atual, em que vemos na operação, mais um motivo de vaidade pessoal, que chega a relegar a planos inferiores, assuntos de maior importância e interesses momentâneos da nação, e, que, indisfarçadamente, objetivam imortalizar a passagem do sr. Kubitschek pelo Catete. Nos sentiriamos mais felizes (patrioticamente falando), se a imortalidade presidencial do sr. JK ocorresse, como por exemplo, nos móldes da ação do saudoso sr. Washington Luiz.

A imprensa em geral, sentinela avançada de nossa democracia, não tem poupado críticas a atitude do sr. Juscelino Kubitschek, acêrca de Brasília e sua construção. Só órgãos “oficiais” ou financiados politicamente, através de jornalistas e reporteres pouco imparciais, é que têm louvado tal proceder, de modo indistinto e sem restrições.

Nós, realmente, não conhecemos a “nova capital”. E, sinceramente, pelo que nos informaram pessoalmente aqueles que já tiveram êsse ensejo, não alimentamos, tão já, tais pretensões.

É claro (conforme assevera nossa leitora), não podemos fazer juizo aprofundado da questão. Jamais fizemo-lo. Apenas comentamos em alguns de nossos artiguetes, a fórma de execução e abordamos pareceres ou comentamos escritos à respeito. Isso é perfeitamente normal, enquadrando-se nas atividades jornalísticas. Errariamos, isso sim, se nos atravessemos a provar (por “a” mais “b”), que o Presidente está certo ou errado nessa empreitada.

De qualquer maneira, as observações e mesmo as palestras (a de ontem durou cerca de 20 minutos) de nossa “leitora do telefone” trazem sempre alguma utilidade para nós.

Quanto ao assunto referido, póde estar certa a pessoa com quem falamos, será focalizado nestas colunas. Iremos apenas coligir mais alguns pormenores e “soltaremos a bomba”.

Extraído do Correio de Marília de 18 de janeiro de 1958

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