Nova guerra? Os “pracinhas” não irão... (23 de julho de 1958)

Pergunte o leitor a um “pracinha” se êle irá, espontaneamente outra vez às armas, no caso do Brasil entrar em nova guerra. Indague de algum daqui ou de fóra, para que não venha a pensar que êste artiguete foi escrito depois de convencimento com os ex-combatentes radicados em Marília.

Indague ao mesmo, que seja sincero e responda a pergunta. Depois raciocine sôbre a resposta que receber.

Temos a certeza de que nenhum dirá a você, leitor amigo, que está disposto a pegar em armas novamente para defender o Brasil. Se já, antes, por motivos de saúde, de mágua da ingratidão dos govêrnos, o mesmo não sentia mais em seu peito, aquela chama incandescente do patriotismo adquirido nos bancos escolares e nas instruções militares de pré-guerra, muito menos agora, após os excessos verificados no reconhecimento aos campeões brasileiros de futebol.

Poderá parecer falta de patriotismo, mas como se justificará essa falta se ela já foi provada sobejamente? Como compreender isso que parecerá falta de amor ao Brasil, se êsse mesmo amor já foi corroborado, com a ilustração de belíssimas páginas de sangue, conquistas e feitos gloriosos?

Do Rio partiu a clarinada de alerta aos govêrnos. Após os excessos cometidos com referência às demonstrações de apreço e reconhecimento oficial aos campeões brasileiros de futebol, decidiram os “pracinhas” que se o Brasil entrar em nova guerra êles não irão; preferirão ser desertores. Tal assertiva o autor destas linhas afirmara anteriormente (e há tempo), através desta coluna, e, na presença de várias pessoas, quando de um almoço de confraternização. Estavam presentes, dentro outras pessoas, o Prefeito Municipal, o vereador Coriolano de Carvalho, o vereador Nasib Cury, o então delegado de Polícia dr. Claudemiro de Carvalho, o popular “Amigo Silva” e outras figuras de nossa cidade. E dissemos, na ocasião, que, em face dos descasos dos govêrnos, no atendimento de direitos legais que nos assistiam, momentos existiam em que tínhamos vergonha de ser brasileiros. E arrematávamos nossa desabafo, dizendo que, por espontâneo patriotismo, jamais iríamos participar de nova guerra, se, desgraçadamente, o Brasil viesse a ser envolvido.

Nas ocasiões, pareceu que exageramos. Os fatos, o tempo, as circunstâncias, vieram provar que estávamos certos. Levanta-se na Capital da República, bem às barbas do Presidente Kubitschek, movimento coincidente.

Mais de doze mil “pracinhas”, declararam à imprensa, que, se o Brasil entrar em nova guerra e os convocar, êles desertarão, preferindo o exílio mesmo em selvas ou o cárcere como desertores, mesmo com a pecha de covardes, do que lutarem novamente, e, se regressarem, receber as recompensas que receberam até agora.

E abordaram os descasos dos poderes governamentais e os exageros dos govêrnos e mesmo de grande parte do povo brasileiro, quando do regresso dos atuais campeões de futebol do mundo.

O caldeirão no Oriente começou a ferver. O Brasil tem lá um Batalhão e quem está num salão de baile, poderá participar da festança de uma hora para outra.

Os “pracinhas” já declararam: êles não irão guerrear novamente. Nós concluímos: Para a próxima guerra, o Brasil contará com 22 campeões de futebol. Êles que partam para o “front”, porque a recompensa já lhes foi paga antecipadamente...

Extraído do Correio de Marília de 23 de julho de 1958

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O jogo do bicho (26 de outubro de 1974)

O Climático Hotel (18 de janeiro de 1957)

“Sete Dedos”, o Evangelizador (8 de agosto de 1958)