O “estouro” da paciência (22 de janeiro de 1959)

Acontecimentos trágicos, desenvolveram-se recentemente na cidade mineira de Uberlândia. U’a multidão enfurecida, depredou cinco cinemas daquele extraordinário e adeantado centro montanhês, inutilizando quasi completamente as mencionados casas de espetáculos e ocasionando prejuízos de grande monta.

A análise do fato, não é tão fácil assim, como à primeira vista póssa parecer. O problema que originou êsses resultados, encerra a sua faceta de complexidade.

A atitude não póde, de afogadilho, ser condenada, da mesma maneira que não póde ser apoiado. U’a análise de meio têrmo deve ser a função especifica da questão.

Se, de um lado, é passível de censura todo o áto marcado pela revolta, toda a atitude que objetiva ou que na realidade prejudica a propriedade alheia, não menos é exato que existe no caso alguma razão, plenamente justificada.

A paciência do homem tem um limite e o “estouro” desta é sempre imprevisível.

Todos sabemos, ou por experiência, ou por conhecimento de causa, ou mesmo por ouvir dizer, que até um crime dos mais hediondos aparentemente, praticado muitas vezes com verdadeiro e palpável requinte de selvageria, tem lá seu fundo, uma inequívoca razão de ser. Os magistrados, os advogados e os policiais, sabem disse melhor do que ninguém.

Póde ser considerada infeliz, toda a nação, cujos filhos se dispuzerem a fazer justiça com as próprias mãos!

No Brasil, graças a Deus, em comparação com outros países do mundo e mesmo da América do Sul, desfrutamos o privilégio de uma pacificidade interna das mais invejáveis. Poucas vezes a história registrou acontecimentos trágicos, mesmo apesar das seguidas ameaças e das nuvens negras de insegurança e do cáos moral e econômico que nos domina e ameaça sufocar quasi seguidamente.

Se olhamos para as nações visinhas, constataremos com satisfação, que ainda possuímos frieza para enfrentar os fatos e a realidade dos mesmos, com serenidade invejável.

Mesmo assim, vez por outra, a paciência do brasileiro “estoura”. Com o espírito mesclado de diversas raças, sem que constituamos um povo de origem pátria de caráter porcentual único e verdadeiramente sólido no terreno de oriundidade, fácil é o perceber-se a variedade de pensamentos diversos, a habitar as mentes dos brasileiros. Daí, seria imprevisível o conhecer-se, por antecipação ou por estimativa, até onde chegaria o gráu de consequências de uma revolta ou “quebra-quebra” de proporções gigantescas. Apesar de que o espírito tropicalizado fundiu numa só peça todos os nacionais e estrangeiros, devemos temer muito, quando se fórma qualquer atmosfera de descontentamento popular.

De qualquer maneira, para um bom govêrno, fatos com os que sucederam agora em Uberlândia, como os que principiaram há pouco em São Paulo e no Rio Grande do Sul, devem merecer atenções especiais, com o vasculhamento de suas origens e com medidas preventivas especiais. E essas medidas preventivas, não dizem respeito a prevenção do acidente quando o mesmo já têm meio caminho andado e sim antes de que qualquer caminhada nesse terreno seja iniciada. E isso é fácil fazer. Basta cuidar com mais atenção dos interesses do povo e acompanhar mais de perto os motivos que o desgosta, porque quando o povo grita é porque está com a razão.

O que acontece em Minas é um exemplo veemente, que exige mais atenção do Sr. Presidente da República. O Sr. Juscelino Kubtschek deve melhor analisar e avaliar as razões dêsse “estouro” da paciência popular, antes que a repetição possa imitar o “olheiro” da saúva: “rebentar” em outra parte!

Extraído do Correio de Marília de 22 de janeiro de 1959

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O jogo do bicho (26 de outubro de 1974)

O Climático Hotel (18 de janeiro de 1957)

“Sete Dedos”, o Evangelizador (8 de agosto de 1958)