Duas funções diversas (17 de julho de 1959)


As funções são diversas e antagônica, fóra de qualquer dúvida.

Numa comparação grosseira, o jornalista apresenta algo em comum com o sacerdote. Embora sejamos pecadores comuns, somos forçados a ouvir algumas vezes, autênticas confissões, manifestadas espontaneamente, em sinal de confiança irrestrita e em fórma de solicitação de conselhos; tal qual ocorre com o piedoso padre, que a todos paroquianos atende indistintamente e com inigualável carinho.

Dissemos acima, que é uma comparação grosseira e sem pretensão. Mas é uma verdade. Principalmente para aqueles que firmaram um conceito respeitável entre uma cifra de uma população, que conseguiram impor uma personalidade, um módo de ver as coisas, um jeito de tratar os fatos, à custa de vários anos de luta, de experiência, de privações até. Jornalista nessas circunstâncias, acaba por tornar-se alvo de especiais atenções, muitas vezes dos mais céticos. Principalmente se comprovada a sua intenção, a nobreza de sua luta, a ausência absoluta de motivos de interesses subalternos ou razões simplistas. Então, sem o esperar, principia a tornar-se alvo de simpatias em número maior do que a porcentagem de antipatias prováveis que o possam cercar.

Algumas vezes, alguém nos procura, embaraçando-nos até. É que muitos leitores nos expõem até com problemas de caráter familiar, solicitando-nos conselhos. Coisas que escapam, por completo a nossa alçada, mas que demonstram uma confiança ímpar em nossas pessoas. Nessas ocasiões, sentimo-nos em dificuldades, ao contrário do que seria de esperar – convencidos e orgulhosos. Sentimo-nos em situações difíceis, porque somos forçados a travar conhecimento com certos aspectos da vida humana, conhecendo misérias, injustiças, erros e ingratidões, sem nada poder fazer, sem uma ação confortadora ou prática a aconselhar ou solucionar.

Tal fato, não ocorrerá apenas com o autor destas linhas, é claro. Acontece certamente, com outras pessoas que nem de leve sonhem em rabiscar para jornais. Basta que sejam experimentados na vida, direitos nas suas obrigações, conhecidos e exemplares, para que não falte uma pessoa em situação aflitiva, que os procurem para um conselho, uma consulta, um parecer, uma idéia.

E é verdadeiramente triste, especialmente para aqueles que se julgam de coração bem formado e que são no íntimo, cristãos e sentimentais, o conhecer dificuldades, sofrimentos e misérias alheias, principalmente sem nada poder fazer, desapontando os que buscam pelo menos uma palavra orientadora.

Porisso, dissemos, numa comparação grosseira, temos algo em comum com a sacerdote, ao qual recorre muita gente, em busca de conselhos (que solicitamente são dados).

Se, de um lado nos entristece o fato de algumas vezes causar desapontamento a alguma pessoa que nos procura com o objetivo referido, por outro nos causa felicidade o motivo experimentado, qual seja a demonstração de confiança com que fomos alvo.

Ainda ontem, tivemos o ensejo de conversar com determinada pessoa, que, apresentando claríssima franqueza, nos pedia um conselho sincero, de amizade, leal, acêrca de importantíssima decisão. E não se tratava, em absoluto, de nenhum “pé rapado”, mas sim de um cidadão respeitável e considerado entre nós. Confessamos que não pudemos, sinceramente, emitir um ponto de vista que representasse o conselho aguardado e nos sentimos, ao envés de honrados com confiança, aborrecidos em não poder satisfazer a intenção de quem nos procurara.

Estes fatos, não representam nenhum convencimento. Pelo contrário, significam a humildade ante certas deferências que situações nos apresentam. Representam uma consideração especial a alguns modestos trabalhos em Marília, muitas vezes sacrificando o conforto do lar ou o aconchego da família, com o desiderato único de servir uma causa, uma cidade, um povo. Pelo menos, essa é a nossa intenção. E se tal conseguirmos realizar, legaremos aos nossos herdeiros apenas uma coisa: um nome honrado e ações insuspeitas.

Extraído do Correio de Marília de 17 de julho de 1959

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