“Galo de briga”? (26 de fevereiro de 1960)



O fato ocorreu mais ou menos assim:

Certo leitor nos parou ali na Avenida um dia dêstes. Convido-nos para o clássico cafezinho. Enquanto aguardávamos a ocasião de saborear a rubiácea, o nosso amigo principiou a falar sôbre multiformes assuntos. Primeiro foi o caso da vitória espetacular do São Bento sôbre o Bragantino; depois o carnaval; e outras questões diversas. Nosso amigo saltava de um motivo para outro, qual canguru picado por marimbondo.

A vida de hoje demanda urgência. Estávamos apressados, pois tínhamos adiante compromisso de trabalho com hora marcada. O rapaz estava, não há dúvidas, com vontade de falar e nós, embora sem a indelicadeza na ocasião de dizer-lhe que não estávamos dispostos a ouvir muita coisa, dissimulávamos, olhando insistentemente o velho relógio – forma indireta de dizer que se está com pressa.

Nosso amigo não percebia ou não queria entender a insinuação. Continuava a abordar uma série de assuntos. Nuns 10 minutos de “conversa mole”, o rapaz já havia “solucionado” uma série de problemas: os viadutos, a visita de Eisenhower, o custo de vida, etc..

Foi quando o rapaz se voltou para os elogios “de corpo presente”, dirigidos ao “escriba”. E a par dos “confetis” que nos atirou, ousou até dar-nos assim improvisamente, algumas “aulas de jornalismo”. “Jornalismo” existente lá na sua concepção, é claro. Insinuou que nossa missão está algo errada, pois não “metemos o pau”. E falou que deveríamos “descer a lenha” em fulano, beltrano e cicrano, pelos mais absurdos motivos que imaginou!

A três por dois fazia questão cerrada de frisar, com alguma ênfase e com inusitada convicção, de que “se êle fôsse jornalista” as coisas andariam “na linha” aqui em Marília e muita solução seria encontrada para uma infinidade de problemas!

Mas o negócio não parou aí. O rapaz, multi-reprisadamente confesso nosso ardoroso fã, nos convidou para uma festa que realizaria em seu lar. Com questão cerrada. “Olhe, não vai faltar”, repetiu inúmeras vezes.

Na festa programada, conforme nos asseverou, deveriam comparecer as mais expressivas autoridades e personalidades da Comarca; ao lado, é lógico de seus amigos particulares. E o rapaz nos colocou na “sinuca”, quando, falando sério afirmou:

“Na hora do “grude” eu falarei alguma coisa e em seguida passo a palavra a você. Então você aproveita e “mete o pau” em fulano...”

Até aquêle momento, estávamos ouvindo o homem “papagaiar” incessantemente; foi então que não aguentamos mais. Afinal não somos “galo de briga”. Explicamos ao nosso amigo que êle procurasse outra pessoa para “tábua de bater roupa”. Nossa missão, no jornalismo provinciano é bem outra.

O rapaz, teimoso como êle só, não se deu por vencido. Contra-argumentou que essa atitude nos colocaria ainda mais em evidência, pois representaria uma coisa que ninguém até aqui tinha possuído: a coragem de “lascar a lenha” em fulano, na presença de gente, mesmo na cara do sujeito!

Acabamos por largar o rapaz falando sozinho, apesar de que não gostamos de ser mal educados. Mas fizemos o que nos competia fazer, pois estávamos saturados de conversa sem base.

E “estouramos”, é verdade. Afinal, logo na nossa sombra o rapaz pretende fazer “pic nic”? Vá ao Rio do Peixe, amigo!

Afinal, não somos “galo de briga”.

Extraído do Correio de Marília de 26 de fevereiro de 1960

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