TIPOS & COISAS E CASOS (7)



Razão tem antigo brocardo, quando afirma: “Na briga de sirí com caranguejo, quem acaba apanhando é o camarão”.

Assim era a cidadezinha de Varjão da Purunga. Situada entre duas outras cidades desenvolvidas e visceralmente rivais. Não tinha tempo, nem espaço, nem chances de progresso. Estava fadada a um ostracismo permanente. De um lado, Poço do Sossego, crescendo sempre. De outro, Bananeiral, igualmente desenvolvendo-se. E ambas procurando cada vez maior agigantemento progressista, estavam sufocando Varjão da Purunga.

Esta havia nascido fadada ao acomodamento compulsório. Município de pequena área; cidade pequena, cheia de problemas; arrecadação municipal, diminuta; carente de tudo: escolas, rede de água, esgôto, estradas, guias de sarjetas e tudo o mais que representa sinal de mínimo comezinho progresso.

Aproximavam-se as eleições municipais e havia muita frieza quanto à eleição do novo prefeito. Os que por ignorância de realidade se animavam a candidatar-se, possibilidades não tinham. Os que, havendo chances preferenciais, sabedores do espeto e das pepineiras que iriam topar pela frente, não se animavam à disputa.

Edgard éra o secretário, tesoureiro e fiscal geral da prefeitura. Entrava e saia prefeito e ele lá, firme como o Pão de Açúcar. À rigor, ele sempre fôra o prefeito de fato. Não o revelava, mas ele, o Edgard, éra o mais interessado e o mais preocupado na eleição do novo prefeito, pois disso dependeria sua permanência no cargo, até quando chegasse a aposentadoria.

Porisso Edgard bolou o lançamento da candidatura do Onofre Perdigão à Prefeitura de Varjão da Purunga. Hábil e sigilosamente, conseguiu dobrar e convencer seu Perdigão, que era sitiante e tinha a única olaria do município, sendo inclusive fornecedora de tijolos para setores de construções de Poço do Sossego e Bananeiral.

Além do Onofre, mais dois outros candidatos surgiram também. Os nomes – como não poderia deixar de sê-lo – foram arquitetados por Edgard, numa estratégia que passara desapercebida por todos os varjenses. Sem possibilidades, sem lastro política, sem programa de governo e, ainda, semi-analfabetos.

Chegou o dia do pleito, a expectativa e a ansiedade – do Edgard, claro. No final da apuração, vitória folgada do Onofre Perdigão.

Passada a euforia eleiçoreira e a posse do novo alcaide, a vidinha de Varjão da Purunga voltou à normalidade. Perdigão comparecia pontualmente ao gabinete, mandava chamar Edgard e com ele traçava os planos de trabalho. Melhor dizendo, era informado pelo assessor de tudo o que deveria fazer e assinar naquele dia.

Por sugestão de Edgard, pediu uma audiência ao Governador e lá foram os dois ao Palácio. Levaram mapas e plantas, esboços e planos e acabaram arrumando um regular empréstimo governamental. De regresso, devidamente instruído por Edgard, o prefeito deu entrevista à Rádio Difusora e ao jornal “A Cidade”. Expos planos de remodelação de duas pontes, de início aos trabalhos da construção de guias de sarjeta na parte central e de melhoria na estrada que ligava ao matadouro.

O povo exultou e para a felicidade do Onofre, tudo caminhou bem, sendo certo de que, quatro meses após, muita melhoria já era visível na cidade.

O prefeito estava verdadeiramente endeusado e eufórico. Edgard traçou uns pauzinhos e conseguiu atrair repórteres de Bananeiral e Poço do Sossego para alardear o progresso de Varjão da Purunga e as obras do prefeito, “o maior administrador do século”.

Um dia, Edgard sugeriu ao prefeito, que organizasse uma visita de inspeção às obras em realização no município e para isso convidasse a imprensa e pessoas interessadas.

Foi feito. No carro da Prefeitura e no jipe do Fiscal Geral, a caravana visitou diversas realizações, como aterros, combate à erosão, reparos de pontes e de estradas e outras.

Onofre ficou intrigado, mas nada disso no momento. Ficou “cabreiro”, porque em todas as realizações de sua administração lá havia uma tabuleta, que ele não entendia porque.

Depois da visita, já no seu gabinete, mandou chamar o secretário. E disse: “Seu Edgard, tenho ouvido falar em Petrobrás, Eletrobrás, Gasbrás e outros nomes parecidos... mas em todas as obras que visitamos hoje, em todas elas, havia uma tabuleta com uma firma que eu não conheço e que nem sei o que ela faz na minha cidade... que tal “Emobrás” é essa que encheu a cidade de tabuletas e que eu não conheço?”

Aí o assessor baixou a cabeça para evitar um sorriso e esclareceu:

- Seu prefeito, as tabuletas que o senhor viu não dizem “Emobrás”... dizem simplesmente “Em obras”...

Extraído dos arquivos pessoais de José Arnaldo com data de 18/8/1988

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