Postagens

Mostrando postagens de maio, 2012

TIPOS & COISAS E CASOS (12)

Era um arraial. Presunçosamente, havia quem o chamasse de cidade, ou de vila. Mas era um arraial. Com vida própria, porque interligava muitas e pequenas propriedades agrícolas. Tinha seu cineminha, que funcionava aos sábados e domingos. E também uma espécie de posto de gasolina, onde o combustível era trazido em tambores para servir a população. O açougue do Frederico, que matava uma rês por sábado. O posto de saúde, cujo médico vinha uma vez por semana para consultar quem precisasse. Havia também a farmácia do seo Osorio, o campo de bocha do Felipe, o bar do Custódio e o armazém do Salim. O movimento aos sábados às tardes e aos domingos era enorme, pois os sitiantes vinham todos para o arraial. Custódio vendia cervejas, guaranás, cachaça e sanduiches de pão com mortadela. O movimento comercial maior era do Salim. O turco tinha de tudo: arroz, feijão, fumo em corda, enxada, foice, enxadão, óleo, vinagre, banha e toucinho, botinas e tudo o necessário. Tudo era uma família.

TIPOS & COISAS E CASOS (11)

Cidade pequena, onde todo mundo sabe tudo, sobre todo mundo. Existem os cochichos, o respeito, e desconfiança, a maledicência. Se alguém via o padre sozinho à noite, já maliciava o que deveria e o que não deveria. Se o Salim da lojinha apresentava alguma melhoria estética e pessoal, já desconfiavam que ele estava roubando muito. Se a mulher do açougueiro andava sozinha na rua, mesmo para fazer compras, não faltava quem cortasse sobre a dignidade da coitada. Mulher que andasse com um decote liberal, por pouquinho que fosse, já era marcada pelos línguas-pretas da cidade. Se o comerciante fosse gentil com uma freguesa, já iria surgir quem pensasse ou quem dissesse algo vergonhoso, inverídico, sofismático ou até pecaminoso da pobre cliente. Fóra isso, cidade normal. De gente boa, ordeira, trabalhadora. Certo de que os buchichos circulavam entre poucos e que eram por isso conhecido nesse sentido, entre poucos também. Como num rebanho: boi preto, com boi preto. Mas existe a

TIPOS & COISAS E CASOS (10)

Fidelcino era baiano de nascimento. Muito cedo, ficou órfão de mãe e dois anos depois, o pai também veio a falecer. Apareceu uma oportunidade e ele veio de pau-de-arara para São Paulo. Sozinho, mas de boa índole, procurou logo um trabalho honesto. Arrumou emprego de faxineiro num hotel. Alguns meses depois, foi trabalhar como “office boy” de um escritório de despachante. Deixando o cargo de boy, foi ser chapeiro de uma lanchonete. Depois de algum tempo, entrou numa oficina de consertos de eletro-domésticos, mas não ficou só alí. Sua vocação para serviços mecânicos e manuais apareceria sem que ele mesmo esperasse. Um sábado à tarde, uma madame do prédio de apartamentos vizinho, foi até a oficina do patrão de Fidelcino, seu Olegario. Este não estava e a mulher desejava que se fizesse um reparo na máquina de costura que apresentava um defeito. Fidelcino alegou que o patrão não compareceria mais aquela tarde e que só retornaria ao trabalho na segunda-feira. A mulher explicou que es

TIPOS & COISAS E CASOS (9)

Santiago era um imigrante espanhol, semi-analfabeto, “roleiro” no bom sentido. Não gostava muito do batente, mas vivia de certa forma bem e senão cem por cento honestamente, pelo menos noventa e oito por cento de maneira decente. Muito bom de papo. Lia todos os jornais e livros que podia e isso acabara por fazê-lo detentor de um apreciável cabedal de conhecimentos. Viajava muito, sempre na zona rural. Em todo o lugar onde passava, conquistava amigos, acabando por comer, beber e dormir. Acertava seus “rolos” com muita maestria. Conseguiu área de terras dos sitiantes, para plantar alho, com uma técnica própria e especial, conforme apregoava. Era tão bom de lábia, que os sitiantes acabavam estregando as terras preparadas e com sua conversa, acertava outros caboclos para o plantio e cuido, até a safra. Tudo na base de “meia”, mas na verdade Santiago ficava com a parte do leão. Fazia garrafas de remédio, com vinho branco, permanganato de potássio e carqueja, que eram “um porrete” pa