Mendigos & Mendigos (15 de setembro de 1973)



Certa ocasião, por volta das vinte e duas horas, um dos meus filhos, palestrava com um amigo, defronte à Casa Econômica.

Ele e um outro jovem, alheios ao mundo, abordavam assuntos banais, porém importantes para ambos, como elo de amizade pessoal.

Inesperadamente, uma viatura policial e um carro de presos da PM, pararam defronte um estabelecimento comercial próximo ao citado local. De seus interiores, saltaram soldados. Alguns militares ficaram à porta, impedindo a saída do público que estava no interior do estabelecimento. Outros entraram e começaram a conduzir rapazes para o “tinteiro”.

Meu filho e o rapaz ficaram olhando o movimento, sem saber o que estava ocorrendo. Não saíram dali, mas também não se aproximaram do “rôlo”.

Absorvidos em observar o que estava ocorrendo, não perceberam outro grupo de soldados, que os cercaram. E foram conduzindo os rapazes, para o interior da viatura policial.

Ambos protestaram, como não poderia deixar de ser.

Os policiais não quiseram saber de nada. Apenas justificaram que os moços iriam “conversar” com o delegado de plantão. E, mesmo sob protestos, foram conduzidos à delegacia de polícia.

Meu filho estava fazendo o Tiro de Guerra, e, como soldado, tinha o cabelo cortado militarmente, mas os soldados nem isso notaram.

Na polícia, assim que esclareceu que se encontrava ocasionalmente nas proximidades onde parou a “canoa”, dizendo quem era e onde trabalhava, foi imediatamente liberado.

Depois, ficou sabendo a razão da providência policial: uma batida de repreensão ao uso de entorpecentes.

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Lembrei-me desse caso, ao ouvir na última sessão da Câmara, quando no período de “explicações pessoais”, o vereador oposicionista Octávio Torrecilla, voltou a abordar o “caso mendigos”.

O edil emedebista, que tem minha admiração pelo seu ardor de luta, embora eu não concorde com seu ponto de vista sobre a citada questão, dramatizou e enfatizou um aspecto isolado do caso.

Supondo que ele tenha integral razão sobre o motivo que o levou a ocupar a tribuna, convém não esquecer que o vereador deveria reconhecer, também, por equidade, os casos demais existentemente comprovados, do ról gigantesco de malandros e pinguços fantasiados de “mendigos”.

No caso inicial, meu filho foi no roldão da batida policial que procurava reprimir um vicio maléfico. Ele culpa não tinha. Foi detido para averiguação, somente porque “se encontrava próximo” ao ponto onde se fêz presente a “canoa” policial.

Daí, ouvindo pelo rádio a fala do vereador, pensei com meus botões:

- Quando o cidadão que é edil denunciou, foi preso e “exportado” injustamente, não estaria ele também, junto, ou próximo, ou em locais frequentados pelos falsos pedintes?

Quero crer, que a “operação limpesa”, não iria deter um cidadão nas condições enfatizadas pelo vereador, se pelo menos aparentemente, alguma correlação ou aparência não tivesse existido.

Não é uma certeza, mas apenas um pensamento.

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Ante-ontem, fui tomar um cafezinho ali na Avenida, em companhia do vereador Camarinha. Topei no local, com o edil Torrecilla, que batia um papo com o ex-vereador Ariel Fragata.

Convidei ambos para o cafezinho.

Ariel recusou.

Quando nos aproximamos do balcão, juntamente com diversas outras pessoas, um desses pedintes, que não é mendigo e sim vadio, com hálito de cachaça, veio à mim, pedir “um dinheirinho”.

Neguei, é claro.

E, dirigindo-me ao Torrecilla, disse-lhe em brincadeira, em voz alta para todos ouvirem:

- Torrecilla, olha o seu aí!

Extraído do Correio de Marília de 15 de setembro de 1973

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