Uma classe humilde e ignorada (19 de setembro de 1974)


Certa feita – faz isto alguns anos já – encontrava-me num estabelecimento comercial, na Rua Cel. Galdino, quando ocorreu o fato que a seguir narrarei.

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Prestava eu, esporadicamente, à guisa de “bico”, serviços de contabilidade ao falecido contador-advogado Dr. Luiz Scaglio, no Escritório Lux.

Vizinho ao escritório existia um bar, onde se reuniam amigos e comerciantes, para os aperitivos ou o clássico “cafezinho”.

Todos conhecidos: os Grassi, os Gradim, os estudantes Solênio Giandom e Dr. Reynaldo Alves de Souza, que eram funcionários de uma filial da Tilibra, além de outros.

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Uma ocasião, quando o bar se apresentava repleto de freguesia, ali adentrou uma mocinha, que deveria ter uns 16 anos. Discretamente pintada – naquele tempo era comum o uso de baton – e bem vestida. Uma moça bonita e aparentemente muito meiga. Conversou com o proprietário do bar demoradamente e saiu levando algum dinheiro e chocolates.

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Um dos fregueses, assim que a moça saiu, perguntou ao Vergílio – o dono do bar – se era filha e o proprietário respondeu afirmativamente. O indagante deu sequência à conversa amistosa, alertando o homem do bar que “se cuidasse, pois com uma moça como aquela em casa, os ‘gaviões’ deveriam andar rondando”.

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O homem limitou-se a responder, simplesmente:
- Se o cara for trabalhador e honrado, de família direita, poderá “embarcar” com a maior facilidade. Desde que não seja vagabundo. Sendo trabalhador, poderá ser até um lixeiro.

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Hoje vem lembrar-me disso.

Do respeito desse homem por outro homem de trabalho. Do exemplo que foi citado nessa conversa sobre um homem trabalhador: o lixeiro.

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É que hoje, 19 de setembro, transcorre o Dia do Lixeiro, data que rende uma homenagem à uma classe de trabalhadores das mais humildes e até ignorada.

Classe, que, mesmo sendo humilde e ignorada, é uma das mais úteis de uma sociedade. Constituída, em grande maioria, de homens de pouca instrução, que ganham o pão honestamente, levando o trabalho a sério, mesmo sem esperar qualquer reconhecimento dos outros.

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A qualquer hora do dia ou da noite, ai estão eles varrendo nossas ruas, recolhendo o lixo defronte nossas residências, para levá-lo a locais onde não incomodem a população.

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Em Marília, o serviço de limpeza pública, as atribuições específicas dos lixeiros, apresentam também a colaboração feminina: as “violeteras”, como carinhosamente as denominou o prefeito Pedro Sola. São moças e mulheres que se dedicam com responsabilidade e atenção à limpeza de nossas ruas. Uniformizadas, aparentemente felizes, perfeitamente cônscias de suas atribuições, sabendo que o trabalho, mesmo de um lixeiro, é digno e honrado.

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Ao ensejo do registro, os parabéns à classe dos lixeiros e das “violeteras”, pela passagem de seu dia.

Porque essa classe, servindo a população, consegue realizar um paradoxo verdadeiramente maravilhoso: executar um trabalho limpo no meio da sujeira!

Extraído do Correio de Marília de 19 de setembro de 1974

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