Uma voz que se cala… (09 de outubro de 1974)


Para quem como eu e tantos outros, que se habituou a ver em jornal algo arraigado dentro do próprio amago, é pesaroso noticiar e comentar o desaparecimento de um jornal – especialmente se for o caso de um dos muitos sacrificados e heroicos jornais interioranos.

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O encerramento de atividades de um jornal é o mesmo que uma voz que se cala, o mesmo que uma vida que se extingue, um organismo latente que expira. Um poro por onde respira a democracia.

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Depois de circular por um espaço-tempo que não chegou a atingir dois anos de duração, deixou de circular no último sábado o vespertino bauruense “Diário da Tarde”.

Dirigido pelo jornalista José Ricardo Aquilino, o referido vespertino tinha sua redação e oficinas na Rua Alfredo Ruiz, na “cidade sem limites”.

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O encerramento das atividades do “Diário da Tarde” quiçá não seja o último a lamentar. A manutenção de um jornal depende de uma série de fatores, despontando como um dos mais predominantes o preço e as dificuldades de garantia de fornecimento de papel linha d’água, destinado à imprensa.

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Em sua justificativa de despedida do público diz, entre outras coisas, o comunicado divulgado pela direção do extinto jornal:

“Se o fornecimento de papel especial para a imprensa não oferece esperança de normalização, com a agravante de que as quantidades disponíveis sofrem reajustes de preços quase bimensais, é fácil a população compreender a impossibilidade de previsões de planejamento administrativo, rotinas básicas para uma empresa e sem as quais não haverá metas, nem segurança para o patrimonio e para aqueles que contribuem com o seu trabalho”.

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O “Diário da Tarde” é o terceiro jornal a fechar em Bauru nestes últimos seis anos, eis que antes haviam igualmente encerrado atividades, por motivos correlatos, a “Folha do Povo” e o “Correio da Noroeste”.

No equipamento gráfico do  “Diário da Tarde” incluía se máquinas de fundição de material, clicheria e titulação própria.

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O aludido vespertino foi editado 444 vezes, tendo iniciado sua circulação em tamanho natural, com 8 páginas, para modificar-se posteriormente, utilizando tamanho tablóide, com 16 páginas diárias.

Perde a imprensa de Bauru e também a imprensa da hinterlândia paulista mais um jornal.

É de lamentar-se esse fato inevitável, que, além de desfalcar a imprensa do interior, veio aniquilar o entusiasmo profissional dos jornalistas José Ricardo Aquilino e Célio Gonçalves.

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Alguém precisaria dizer ao honrado Presidente Geisel que urge a necessidade imperiosa do próprio Governo interessar-se pelo problema de escassez e dificuldades de obtenção das cotas de papel especial para a imprensa, especialmente a imprensa interiorana.

Extraído do Correio de Marília de 09 de outubro de 1974

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